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domingo, 2 de setembro de 2012

Guerras, festa e coisas financeiras

Olimpíadas de Língua Portuguesa/2012
Professor: Julio Cesar de Amorim
Aluno: Gean José da Silva - Turma de 7º ano
Texto classificado da E.M.Esmerino Gomes de Souza.
Gênero textual: Relato de memórias.

 Gerras, festas e coisas financeiras


Peixeiras, facões, foices, espingardas..."coronéis": Mortes. Esta, talvez fosse a visão mais marcante da vida dos adultos em minha infância nos anos de 1940. Não era muito fácil para ninguém, com todas aquelas ocupações, brigas, assassinatos. Pessoas vindas de todo canto atrás de um pedaço de terra...mas não era por ganância não, meu neto, como vemos tanto hoje em dia(comentou meu avô), eles queriam apenas dignidade, precisavam sobreviver, tinham que plantar pra comer. O que se via com frequência eram mulheres chorando nas ruas, fome, doenças e medo. Meu pai, seu bisavô, sempre nos aconselhava a nunca abrir a porta de nossa casa para gente desconhecida. A tristeza se abatia em muitas famílias e seus rostos sofridos, marcados por rugas, cicatrizes, queimados do sol, dificilmente esboçavam sorrisos.

Mas eu era apenas um moleque e ser moleque você sabe muito bem como é, vice!Só queria saber de traquinagem, brincar,tomar banho no rio, nas lagoas, correr nas areias da praia, pular as ondas do mar...eu era mesmo um menino "sambudo"!Lembro muito bem daqueles domingos quando meu pai fazia umas rodas de forró para as crianças dançarem. Era uma alegria só, "homi"! vinha moleque de tudo que é canto, tudo com os "pé" no chão socando o terreiro, rostos suados, mostrando os dentes e alguns nem os tinham! ha, ha, ha!!! (gargalhou meu vô). Qual criança não gosta de uma festa, meu filho?! mas, não era só isso não, tinham também os festejos de São João, todo mês de junho, os ensaios para as danças durante o ano inteirinho e eu sempre lá, eu adorava! tinha uma ruma de dança pra brincar: Quadrilha, Côco de roda, Lapinha, Pastoril..."Osh, Homi"! "néra" só tristeza não!!! A única coisa que não gostava desta época era o apelido que me colocaram, "Pé de paquete", por eu ter um ruma de bicho de pé. Os moleques me aperreavam e à vezes perdia a cabeça e me embolava com algum no chão. Acabava ganhando mais uns tapas do meu pai que me aconselhava a não dar ouvidos a essa caningas de menino.

Todos sobreviviam da agricultura ou da pesca. As casa eram muito simples, de taipa, telhados de palha de coqueiro, "nera" igual essa nossa aqui agora não. Não tinha nem muro separando quintal, tinham algumas cerquinhas feitas de gravetos em pequenas hortas ou em alguma plantinha pra enfeitar, "mó" de proteger dos animais que viviam soltos pelas ruas: galinhas, cabritos, jeques...A gente era pobre mas não passava aperreio não, sempre tinha o "comê". Toda segunda-feira, meu pai ia pescar de linha em seu paquetinho à vela. Lá ia ele com sua cesta feita de cipó e sua lamparina pra ajudar a lua a "lumiá" a noite. No dia seguinte sempre chegava com a cesta cheia de peixes. Hoje em dia nem se vê mais isso, peixe tá tão difícil! (Falou meu avô com olhar distante perdido dentro do mar). Ao chegar em casa, após a noite na maré, me mandava comprar um litro de farinha - a farinha era vendida em litros, medida à colher!- Meu irmão descascava o côco na enchada, pegava mais lenha pro fogão e "mainha" caprichava no peixe assado com farinha de côco...o gosto me veio à boca agora! "Mainha", coitada, sempre estava ocupada com alguma coisa pra fazer pra nós, nem tinha descanso, fazendo o "comê", costurando alguma roupa ou rede, carregando lata d'água que pegava lá no rio pra cozinhar, lavar roupa...a gente não tinha encanamento não, ninguém tinha. Todo dia, sem folga, eu, meu irmão e meu pai íamos pro roçado plantar e colher. A gente cultivava macaxeira, batata-doce, feijão verde, cana,milho, goiaba, seriguela, acerola...e era um pedacinho de chão! Agora não é nosso mais, tem uma casa de veranista plantada no lugar. Dinheiro?! a gente quase não via, nem precisava!

-Ô, tempinho "bão"! (sussurou meu avô).

-"Vamu" lá, painho, pegar os "milho" no roçado! a fogueira já tá armada, hoje é noite de São João! (Disse em voz alta, meu avô, com um sorriso nos lábios e os olhos encharcados).

Que alegria que era, "vice"! e à noite no portão ficavamos eu, minha mãe, painho e meu irmão, assando os "milho" na fogueira, vendo ao longe outras foqueiras nos portões e a lua lá em cima, quietinha, só sentinho o cheirinho a nos observar...

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